terça-feira, 30 de julho de 2013


Como surgiu a função de 
diretor escolar?
Cargo nasceu para organizar o trabalho nos grupos escolares

No primeiro dia de aula de 1894, os alunos da recém-inaugurada escola-modelo Caetano de Campos, no centro de São Paulo, estranharam o ambiente. Até então, eles haviam frequentado classes improvisadas na casa de um professor ou em prédios públicos mal conservados. A gigantesca estrutura arquitetônica do novo edifício - com 60 salas de aula, laboratórios, pátio, biblioteca e museu - era o símbolo da renovação educacional prometida com a Proclamação da República, em 1889. E o início de uma nova organização: a dos grupos escolares, criada por reformadores como Antônio Caetano de Campos (1844-1891), retratado na ilustração.
Esse modelo, forjado pela proposta iluminista republicana de racionalizar custos, exercer controle e oferecer acesso à Educação para todos, reunia de quatro a dez grupos de alunos, que até então estudavam isolados. As crianças passaram a ser organizadas por classes seriadas de acordo com o nível de conhecimento, com um docente para cada 40 pupilos. Funcionários com formação diversa passaram a cuidar da aplicação do currículo e do gerenciamento da escola. A fiscalização dessa instituição não poderia mais ser realizada a distância pelos inspetores. Era preciso ter alguém dentro da escola e, assim, surgiu o cargo de diretor. Cabia a ele fazer a interlocução junto ao governo e determinar as diretrizes administrativas e pedagógicas dos grupos. A influência dele passou a ser tão grande que quem exercia o posto era frequentemente convidado para assinar artigos em revistas e jornais, fazer conferências e se tornar conselheiro de secretários de estado. João Lourenço Rodrigues (1869-1954), inspetor geral de ensino de São Paulo, assinalou em relatório de 1908: "A escolha do diretor é uma questão de vida ou morte. Pode-se dizer, em geral, que tanto vale o diretor, tanto vale o grupo".
Essa concepção de organização escolar espalhou-se durante as três primeiras décadas do século 20 para estados do Sul ao Nordeste. Porém o ideal republicano de Educação para todos, tendo os grupos escolares como embrião, não se concretizou. A falha foi pedagógica e também material. A homogeneização das classes otimizou recursos e esforços, mas a escola republicana gerou altos padrões de seleção e exigência - que acabaram por excluir as crianças de classes menos favorecidas. Concebida para ser do povo, tornou-se das elites. Faltaram professores qualificados, estrutura para atingir o interior e atender toda a demanda gerada com o crescimento demográfico e recursos para a construção de novos estabelecimentos nos padrões de excelência da Caetano de Campos. Em 1920, o estado de São Paulo tinha 67,9% das crianças em idade escolar fora das salas e 74,2% da população era analfabeta.
A despeito do fracasso desse modelo, ele durou até meados de 1970 e a estrutura dos primeiros anos do Ensino Fundamental, hoje, é praticamente a mesma dos grupos escolares da Primeira República (1889-1930). Problemas como infraestrutura e formação de professores continuam em pauta. De positivo, permanecem apenas a importância do diretor - agora reconhecido como gestor - e seu papel decisivo na realização do sonho republicano de uma escola pública de qualidade para todos.
Gustavo Heidrich (novaescola@atleitor.com.br)

Quer saber mais?
O Legado Educacional do Século XIX, Dermeval Saviani e outros, 235 págs., Ed. Autores Associados.
História das Ideias Pedagógicas no Brasil, Dermeval Saviani, 492 págs., Ed. Autores Associados.
Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/gestao-escolar/diretor/surge-diretor-escolar-482307.shtml>. Acesso em: 28/07/2013.



Um comentário:

  1. “É preciso, (...) libertar o diretor de sua marca antieducativa, começando por redefinir seu papel na Unidade escolar. À escola não faz falta um chefe ou um burocrata; `a escola faz falta um colaborador, alguém que, embora tenha atribuições, compromissos e responsabilidades diante do Estado, não esteja apenas atrelado ao seu poder e não se coloque acima dos demais.”

    Vitor Henrique Paro (1997, p.112)

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